segunda-feira, 20 de julho de 2009

A louca engenharia de um vício

eu tenho um grande vício que todo dia
alimento e depois vou devagar,
vou correndo, como se desesperado
estivesse, sem destino, para todos
os lugares e olhares e sentidos;
vou correndo, como quem tenta encontrar
figuras sem imagens, sem pensamentos e
loucuras sem entraves e partidas sem revoltas

acumulam-se agora revoadas
de pensamentos sem imagens; revoadas
de poemas, de palavras, de sentidos
desencontrados e saltitantes; águas
passadas que se encontram aqui comigo
com a superfície deliciosa
à minha frente. vamos nadar por cima
de mim, de minhas forças, alimentando
os meus vícios e medos, distantes desses
modelos formais, cravando na pele,
confirmando o vício que de meus poros
e orifícios escapa, para além
de um mundo de fagulhas e de chamas
que não se apagam eu tenho um vício,
delicioso vício, que se chama
VIDA.

20/07/09

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Não sei o que dizer. As palavras apenas saem, vazam, como um cano furado e cheio de água por dentro.

Gosto de ver as palavras no papel. Assim, no computador, fica estranho, pois não as consigo tocar. Eu gosto das palavras, de sentir o gosto quando toco, mas não toco com os olhos e sim com as mãos, não posso tocar se estão separadas de mim pela tela do computador.

Escrever talvez seja a melhor coisa que existe. Mas quando o que você escreve vai pro papel digitado. Não gosto de coisas escritas a mão, a digitação tem um todo um charme, consegue me encantar, confesso. Mas ainda assim eu resisto e escrevo, mesmo com a minha impressora quebrada. Se pudesse ficaria anos a fio só escrevendo, qualquer coisa que vem à cabeça. Não queria que isso soasse como desabafo, mas talvez seja apenas um desabado, ainda mais porque estou falando que não queria isso. Que seja! Pelo menos estou escrevendo, isso é o tudo o que mais me importa.

Queria sentir o vento do tempo batendo em meu rosto, em meus cabelos. Queria não sentir tanta falta das novidades e, por isso mesmo, tentar alcançá-las, num vazio discreto que o horizonte aponta quando amanhece. Depois que tudo ficar pronto, que todo esse barulho de teclas do computador parar, depois de tudo, apenas vou suspirar e sentir tristeza, tristeza por já ter terminado de escrever, tristeza por não poder tocar no que escrevi, tristeza, apenas tristeza. Mas ainda uma tristeza alegre, uma alegria difícil, uma tristeza extremamente ativa – é a atividade a marca mais forte da alegria e as alegrias são sempre passageiras (ainda bem, só assim as podemos reinventar). As alegrias passam como as pessoas que gostamos entram e vão embora de nossas vidas. Sempre fica alguma coisa, embora já não seja mais alegre, nem triste, apenas alguma coisa, algum sentimento que não pode mais ser nomeado.

Os pontos, as vírgulas, os travessões para colocar comentários no meio das frases, os parênteses que têm quase a mesma função dos travessões, o ponto e vírgula que deixa com que possamos separar longas frases explicativas no discurso, as aspas que permitem a ironia e os acentos, os queridos acentos, que servem para indicar a entonação. Eis a língua. Mas não aceito a língua como ela é, consigo fazer seus signos falarem mais do que isso, consigo – ou pelo menos tento – fazer com que toda essa engrenagem gramatical que exerce poder saia de sua ordem funcional e consiga girar em outro sentido. É o que tento fazer quando escrevo. Por isso alterno frases curtas e longas. Como essa. Ou como a primeira frase desse parágrafo. Por isso também alterno parágrafos curtos e longos ao longo de meus textos. Por isso muitas vezes repito expressões e separo com pontos o que poderia ser apenas separado com vírgulas. É uma questão de estilo. É uma questão experimental. É isso, é uma questão experimental.

Escrever, eu amo escrever e odeio as coisas já escritas, ler as coisas que escrevi eu odeio. Escrever, eu adoro esse processo, esse ato. Escrevendo. É muito bom estar escrevendo, sinto que poderia ter acabado esse texto alguns parágrafos atrás, mas continuo me alongando, não consigo parar de escrever. Não quero mais dizer nada, se quiser pare de ler agora, pouco me importa se estão querendo ler o que escrevo, eu apenas quero escrever, vomitar, regurgitar o que me importa e conservar o que me interessa agora. Antes de morrer eu quero ter escrito muito mais coisas como essas, melhores do que essas. Antes de morrer eu apenas quero escrever, uma, duas linhas, coisa pouca, qualquer coisa sem sentido que afirme ainda mais a vida ante à morte.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Contra tempo

Deixe o tempo passar
Ele apenas funciona
Como a velha engrenagem
Que parado apenas vê o
Mundo
Se movimentar ao seu
Redor
[como um turbilhão
de sentimentos inominados

Os sentimentos mais novos:
mais desnecessários;
Os sentimentos mais óbvios:
mais desencontrados.

Como as alcatéias desesperadas
Em noites de Lua Cheia:
Uivando sem parar, em desespero
para todos os lados:
contra o destino]

Volto-me contra a técnica do tempo
Cronos que mata seus filhos
E tempera seu almoço com as vísceras
E faz choriço com o
sangue

O sangue do tempo é verde
Cronos agora morre com sua técnica
E tudo que é verde se apaga
[mas a grama ainda é grama
e não é verde
pois não é o verde que tem a grama
é a grama que possui o verde

mais variadas são as gramas
e somente verde, pode ser o verde,
ainda que não seja a grama
que dele se aproprie]

O que seria do tempo se não fosse
Sua técnica de mortificar?
Eu serei eterno, mesmo que eu seja
Arrebatado por suas garras:
ficarei do lado externo do terreno
que suas mãos podem alcançar.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

ESPECULAÇÕES
Sobre qualquer coisa ou sobre coisa alguma. Não faz diferença. Especulações. Isso é o que interessa agora. Eu só preciso escrever qualquer coisa. Nunca fiz um texto assim em tom “dialogal”. Desculpem se for muito “freudiânus” e se a linguagem mais “chula” não o agrada, não leia.

Estive observando, mas o mundo é machista e o símbolo disso é o formato fálico dos objetos. Garrafas, gravatas, lápis, canetas, microfones, chaves, controle remoto, pilhas, torneira, cano, porrete, revólver, bazuca, espingarda, machado, tubo de desodorante, farol, antenas, pára-raios, torre, árvore, braços, pernas, estradas, trens, metrôs, cenoura, mandioca, pepino, banana, pirulito, espeto, faca, palito de dente, espada, enxada, foice, escova de dentes, tubo de pasta, guitarra, dedos, tudo, tudo, tem o bendito formato fálico. As mulheres por exemplo, algumas delas não usam aquelas piranhas pra prender o cabelo, mas, sim, uma madeirinha, também em formato fálico. Em todos os locais tem isso. Um dos símbolos do poder dos reis era o cetro – querem algo mais fálico? E os mastros onde colocam as bandeiras. Porque tudo tem que ser fino e comprido? Porque essa distorção toda entre as medidas (comprimento e largura) das coisas? Tanta fixação assim pelo órgão sexual masculino parece nos dizer alguma coisa: vivemos numa sociedade machista.

Mas essa sociedade machista dentro do capitalismo já se mostra com outras peculiaridades que ganhou do capitalismo. Acho possível que o capitalismo, sim, só seja possível com o machismo. Não por acaso, não foi uma reunião de machos que fundou o capitalismo. O capitalismo não foi simplesmente fundado “declaramos fundado esse modo de produção e o batizamos de capitalismo”, é claro que isso não aconteceu, foi uma série de processos que levaram à transformação do mundo feudal ao que hoje conhecemos por mundo capitalista e é claro que isso não foi bem preciso, a história acontece de modo entrecortado. As coisas foram acontecendo, acontecendo, de modo quem algum dia alguém percebeu que certas relações da sociedade feudal foram perdidas em alguns locais e tendiam a se perder em outros locais, esse processo foi se alargando e hoje ainda conservamos sim modos de uma sociedade feudal, mas é quase nada, com certeza. Voltando para o trilho o argumento inicial: o capitalismo precisa do machismo, não porque ele tenha sido fundado por uma casta de machos, mas porque toda a história da propriedade e da própria humanidade foi machista – de um modo geral – provavelmente porque os povos primitivos se impusessem pela força e a mulher sai em desvantagem quando o assunto é força, tais costumes foram sendo repassados de tempos em tempos para as gerações e o machismo foi se propagando. Assim como era comum pensar que os negros constituíam uma raça inferior aos brancos quando se escravizava negros. O fato é que dentro do capitalismo o machismo só se acentua. A exploração do corpo da mulher em revistas de nudez explícita e em comerciais comprova isso. Mais ainda, o fato de haver “revistas masculinas” também confirma isso, pois as revistas masculinas têm menos vendagem, repercussão e quantidade que as femininas, ou seja, as próprias mulheres de uma forma geral não aceitam o fato de ver uma revista com homens pelados, mesmo estando cercadas de falos por todos os lados. A propalada “libertação feminina” também foi apenas uma falácia. A mulher não saiu de casa, ela ganhou as ruas somente porque o capitalismo precisou de mais mão-de-obra, ela vai ao trabalho para complementar as despesas do lar, mas, nem por isso, deixa de ter que cuidar dos serviços domésticos, ela faz apenas hora-extra no trabalho.

A ETERNIDADE


Invadiu o meu mundo e violou tudo, tudo, tudo... tudo ficou de cabeça para baixo e agora tudo e nada parecem ser a mesma coisa. Era como um pequeno vento e agora ficou como um grande redemoinho que me arrasta sem sentido, para qualquer lado. Nada funciona aqui. Nada funciona. A distância pode não matar completamente, mas enterra boa parte de mim. A distância só não consegue nos distanciar, nem afetar os sentimentos. Os sentimentos continuam os mesmos, os mesmos de sempre. Aquele rosto delicado que nunca aparece, só às vezes nos sonhos. Aquele cabelo loiro que quase sempre aparece voando para mim. Posso imaginar ainda uma cena: um lago, cheio de cisnes, o tempo chuvoso, mas ainda com uma pontinha de sol, a grama bem verde – indício de que choveu o mês inteiro –, árvores na grama, nenhuma casa, nenhum caminho, algo parecido com um bosque, nada de coisas de seres humanos, apenas um tapete e uma cesta de piquenique, você no meu colo, minhas mãos na sua cabeça. Cafuné. Quanto a mim... eu confesso... a eternidade poderia ser assim.

sábado, 31 de janeiro de 2009

Desculpa por ter te matado!


É isso mesmo, desculpa por ter te matado. Hoje você morreu para mim, mas há algo sempre vivo de você em mim, afinal, há muito de morte na vida e há algo muito vivo na morte, em todas as mortes. Mais ainda, há sempre um modo diferente de fazer aquilo que as pessoas fazem entre o acordar e o dormir (e enquanto dormem também). As coisas se misturam de uma forma inexplicavelmente veloz.

Desculpa por ter te matado. Eu já não aguentava mais ser sufocado por você, porque eu sei que, mesmo sem falar, você queria me sufocar e eu convivia com o teu silêncio como alguém ameaçado convive com a idéia de uma emboscada, como um perseguido, eu era perseguido pelo teu silêncio – que fala mais que mil palavras e vale mais que mil fatos. Enfim, o “homem, que, nesta terra miserável, mora, entre feras, sente inevitável necessidade de também ser fera!” e “a mão que afaga é a mesma que apedreja”. Então eu te matei para que você continuasse viva de outra forma. Enquanto eu te matava, ao mesmo tempo, eu fazia com que você nascesse em mim, de outra forma, com outro gosto e com outro cheiro. Agora você é só o meu imaginário, não é como uma reprodução, eu não te reproduzo, eu não lembro do teu cheiro, você faz parte do meu imaginário porque o que eu guardo de ti é tudo criação minha, não importa ao certo o que você seja. E assim você nasce em mim para a eternidade. Somos um casal e, ao mesmo tempo, sou seu pai, sua mãe, seu irmão, seu primeiro namorado, seu padrasto, sua madrasta, o ex-marido, sou viúva, nora, genro, cunhado. E ao mesmo tempo eu sei que sou apenas um tufão, um furacão, literalmente um furacão, que violou sua vida e deixou uma marca sem precedentes aí dentro de ti. Estabelecemos uma relação (quase [?]) total.

Desculpa, mil desculpas por ter te matado. Eu te amo tanto, mas tive que te matar. É que o amor está longe de ser um funeral de sentimentos, é um coquetel deles. Eu te odeio também, ao mesmo tempo que te amo. Assim, para te amar mais, eu te matei. Porque eu te odeio eu te matei. Por ser apaixonado por você eu te recriei em mim, eu te recrio a cada instante no meu imaginário. Eu sinto tua imagem, escuto tua pele, vejo teu cheiro, cheiro teu som e escuto teu gosto. Eu não posso deixar nada de ti escapar. Nada, nada. de alguma forma eu sou você e você já sou eu. De alguma forma este amor que eu sinto por ti se comunica lindamente entre nós. E isso que te escrevo... será que algum dia irás ler? Será? Eu não sei, na verdade eu acho que não, mas se lesse não iria acreditar e se acreditasse pouca diferença ia fazer. Vivemos um amor impossível de se realizar como tu imaginas a perfeição de um amor. Assim o amor morre e nasce de outra forma, com outros movimentos, o amor agora é um monstro de feições adoráveis.

E, só pra finalizar, desculpa, mais uma vez, desculpa por ter te matado!


PS: isso é para alguém realmente especial.

Direito a solidão!!

Por que as pessoas não respeitam o direito dos outros de ficarem a sós? Por que há, na sociedade, uma cultura da inclusão barata? Por quê?

Certamente existem muitas respostas para isso. Certamente. Eu não pretendo responder a questão, mas apenas levantar um problema à sua volta.

Para começar, um exemplo: muitas vezes, quando estou em casa lendo, minha mãe me interrompe várias vezes para perguntar besteiras, coisas idiotas como o que eu quero comer. Eu não respondo. Várias vezes ela pergunta, várias vezes eu finjo não ouvir. Até que ela insiste e então eu berro “eu tô lendo, me deixa em paz!”. Será que ela pensa que eu sou tão criança que vou morrer de fome?

Se você está sozinho, calado, as pessoas já logo deduzem (“logicamente”) que você está mal, triste, e perguntam logo o célebre “o que foi?”, será que é proibido, agora, ficar só e pensar em alguma coisa que não esteja ligada diretamente à praticidade imediata da vida besta onde a maior parte dos seres humanos está inserida até o pescoço? Na verdade não há mal algum em estar sozinho, a não ser que você ache que há algum mal em estar sozinho; na verdade, se você acha que há algum mal em estar sozinho – NO MEU MODO DE VER A VIDA – há algo de mal (de errado) em você. É sinal que você espera pelos outros para dar sentido à sua vida, é um claro vestígio que você atribui o sentido da sua própria vida a pessoas estranhas às suas entranhas, é a prova cabal que você tem medo de si mesmo. A solidão é uma dádiva da existência. Aceite a solidão, como quem aceita o ocaso do sol todos os dias e o ocaso da lua toda as manhãs. A solidão é melhor companhia, é quando você consegue entrar em contato com seus mais íntimos e escondidos “eus-perdidos”, “eus-outros”, aquilo de você que se expande, se alarga, já não cabe somente num corpo, num cérebro, numa alma só, é aquilo de você que não pertence a você mesmo, é algo maior que a sua própria existência. São deuses sem nome, mulheres sem sexo, homens sem pêlos, crianças sem choro, o espelho da moça que penteia o cabelo bem na sua frente, o batom da amiga dela, o cheiro do cabelo daquela garota que você sente todos os dias de manhã, aquele perfume tão bom que chega a tomar forma quando entra em você. O tal perfume começa a ser sentido por você, pelo seu tato, pois seus sentidos não se contentam apenas em senti-lo enquanto cheiro, eles alargam-se e criam novas formas de interagir com o estranho cheiro que surge inesperadamente. Há uma infinidade de tribos dessa monta dentro da solidão do deserto que somos, cabe a nós deixar que elas falem, dancem, cantem sua poesia e toquem seus ritmo, ou não, ou fazer com que elas fiquem resignadas e esquecidas, subjugadas, esquadrianhadas de longe por uma espécie de sub-consciente-freudiano-perverso que não deixa com que possamos ter contato com elas. Tudo isso é a solidão. Tudo isso é o que perdemos quando acreditamos realmente haver problemas em não estar sozinho.

Não, eu não estou pregando uma “solitariedade” infinita, uma vida sem contato social. Estou apenas tentando levantar um problema, “abrir os olhos” para algo esquecido em meio a uma cultura da massificação e da inclusão forçada, sugada que foi por uma teia social doente pelo consumo, pelo modo capitalístico de ser, pelo “liberdade de escolher a cor da embalagem”, liberdade virtual, simplista, paradoxalmente aprisionadora, que une as pessoas as separando, pois une as pessoas em torno de mercadorias, então, estamos unidos por gostarmos das mesmas mercadorias, logo, consumimos juntos, mas, de fato, não estamos juntos, somos apenas fruto do acaso do desejo captado. Esses, sim, são os verdadeiros solitários, por isso eles sentem medo, fobia de si mesmo, eles são algo como autofóbicos – se é que esse termo existe. Dentro desse sentido jogado, empurrado goela abaixo à fina força por uma cultura social doente que se baseia na saúde doente dos médicos – comerciantes de uma saúde racional nos moldes da modernidade, portando falida –, estamos nós, vítimas e algozes de nós mesmos, de nosso mundo de solidão. Aqui a solidão nos apresenta. Somos feras, leões, melhor ainda, leoas, prontas para atacar, para comer a carne uns dos outros; e, ao mesmo tempo, servos prontos para o abate. Somos o mesmo e o outro. O sim e o não. O tudo É o nada, aqui. A solidão é justamente a proximidade. É estar só quando você abraça outrem e se sente quilômetros distante daquela pessoa. Essa é a solidão real, o que eu tinha quando minha mãe me perguntou se eu queria almoçar, mais ainda, o que eu tenho quando estou sentado, sozinho, olhando uma formiga se deslocar e alguém me “cutuca” perguntando qualquer coisa, não é solidão, eu estou no mais profundo caos que meus eus outros fazem para que eu consiga sair dessa lógica da solidão inclusiva e sufocante. É sem sombras de dúvidas O MEU MODO DE RESISTIR.